Tenho em mim todos os sonhos do mundo "Apenas quem é desprezível pode ter medo de ser desprezado Fernando Pessoa
terça-feira, julho 10, 2012
23OUT2010 - 277º Dia - Singapura!
Largámos hoje da Marina de Keppel Bay em Singapura. Keppel é uma zona muito nobre e nova da cidade de Singapura onde antigamente existiam estaleiros. Rodeada de condomínios privados já construídos e de outros muito futuristas ainda em construção, a marina tem uma zona para iates e um excelente cais onde a Sagres atracou que permite o acesso directo do público. Mas é uma zona calma e ainda recente com pouca afluência de pessoas.
A chegada foi a 19OUT, depois de passarmos uma noite atarefada no imenso caudal de navios que passam o Estreito de Malaca. No cais aguardava-nos um grupo muito restrito composto por agentes, jornalistas e o nosso Embaixador Jaime Leitão que nos acompanhou na visita de cumprimentos à Autoridade Portuária. Visitámos a torre de controlo do porto que tem estacionados cerca de 1000 navios a cada momento e movimenta diariamente 70 000 contentores. Quanto maior for o navio, mais económico será o transporte da carga, desde que consiga passar pelos Canais do Panamá e Suez. Este porto, para além de se encontrar numa zona de passagem de navios, é um porto de águas profundas e pode receber todos os navios. A carga pode ser recebida de navios mais pequenos oriundos dos pequenos e pouco profundos portos da região e ser passada para os grandes navios que a levam para o porto de águas profundas de Roterdão para ser distribuída na Europa. Isto é o transhipment. O Porto de Sines também é de águas profundas e está a ganhar espaço neste negócio estando inclusivamente um dos seus terminais a ser explorado pelo Porto de Singapura.
A cidade é limpíssima, muito organizada, com muitas zonas verdes e muito regulamentada. Pode-se mesmo dizer que é um jardim com uma cidade implantada. Salta à vista a multa a pagar se não se cumprirem as regras espalhadas por todo o lado e que os residentes não se cansam de nos avisar. Há câmaras de videovigilância por todo o lado, muitos polícias, e uma cultura de queixa - se um carro não para na passadeira o peão telefona para a polícia a dar a matrícula. Chamam-lhe a "Fine City". Cidade fina, agradável, encantadora. Mas fine também significa multa! Existe pena de morte para a posse ilegal de armas ou drogas e até a pastilha elástica é proibida no território. Felizmente, a sensibilização do nosso pessoal teve bom efeito e ninguém foi multado ou teve qualquer problema com as autoridades. Esta foi aparentemente a forma de fazer um paraíso de organização e asseio junto ao equador, no meio da confusão do sudoeste asiático e com uma população de 5,5 milhões de habitantes em que 70% são chineses, 10% malaios e 10% mistos. Aqui convivem em harmonia o confucionismo com o cristianismo, islamismo e budismo. Mas a principal actividade e credo é o shopping and eating - são compulsivos. Há enormes centros comerciais por toda a parte, temáticos ou generalistas, alguns abertos 24 horas por dia. Come-se a qualquer hora. A rede de transportes é muito eficiente e o trânsito muito ordenado. A posse de viatura implica a obtenção de uma licença caríssima e as pessoas optam por não ter carro. Há parques densamente arborizados por todo o lado - chove diariamente e o calor e humidade são insuportáveis mas passa-se muito frio dentro dos táxis, metro, lojas, etc.
A cidade está em constante evolução, ganhar território ao mar é sempre um objectivo, e os habitantes com quem contactámos até se queixam de esta ser uma atitude compulsiva. O certo é que aqui não se sente a crise. Todas as grandes companhias globais têm cá sede ou escritório. O emprego está nos 100% e são importadores de mão-de-obra.
A qualidade da cidade, a segurança, disponibilidade de comércio e serviços atraem inúmeros milionários, nomeadamente dos vizinhos emergentes - Indonésia e Malásia, que têm aqui residência permanente ou temporária. Este é também o local de compras dos mais abastados da região. Há um parque automóvel riquíssimo e casas e edifícios luxuriantes.
Situado no estremo sul da península malaia, o micro-Estado é constituído por uma ilha maior e muitas outras bem pequenas e é habitado há cerca de quatro milénios. Segundo a lenda, Sang Mila Utama, o Senhor de Palenbang procurou aqui abrigo de uma tempestade e viu um animal a quem os seus seguidores chamaram leão e decidiu estabelecer uma feitoria a que chamou singa pura - cidade do leão, nome pelo qual é conhecida desde o final de seculo XIV. A região era habitada por pescadores e tinha algum comércio devido à sua localização mas esteve sempre no meio dos conflitos entre o Sião e Java. Os javaneses ganharam controlo no sec XIV e criaram em Malaca um sultanato de que Singapura fazia parte. Em 1511, com a invasão de Malaca por Afonso de Albuquerque os foragidos do sultanato recuaram para Singapura estabelecendo aí a sua capital que os portugueses destruíram em 1587 e arrasaram em 1613.
Em 1819 Sir Stamford Raffles estabeleceu na ilha um porto franco britânico que teve grande desenvolvimento e foi cedido perpetuamente à Companhia das Índias Orientais pelo sultão em 1824. Esteve ocupada durante a segunda guerra mundial pelos japoneses e obteve a independência de Inglaterra em 1958. Em 1962 o povo votou pela integração na Federação da Malásia mas separou-se logo em 1965 sendo actualmente um estado independente. Desde então é governada pelo mesmo partido que tem a obsessão do emprego, habitação e crescimento. A segurança social é eficiente mas cada cidadão tem a sua própria conta corrente e paga por todos os serviços sendo apenas apoiado quando o seu saldo não permite acesso a determinados cuidados de saúde ou outros serviços. A riqueza do país provém do comércio, do turismo e da refinação de petróleo dos seus vizinhos.
Viemos cá encontrar um sistema de via verde em que os carros pagam para circular na cidade. Todos têm que ter o porta-moedas electrónico que em Portugal foi introduzido no final dos 1980's e não vingou. Aqui foi por decreto! É imprescindível para as portagens e transportes públicos mas também serve nos restaurantes e lojas.
A nossa recepção realizou-se ao segundo dia e teve um papel importante na afirmação da vontade de Portugal que está em processo de instalação da Embaixada em Singapura, autonomizando-a da nossa representação em Banguecoque. Recebemos vários membros do Corpo Diplomático, representantes da Marinha e Portugueses que aqui trabalham e que viemos encontrar bem instalados.
Oferecemos ainda uma segunda recepção em apoio da Associação das Industrias da Madeira e Mobiliário de Portugal que aproveitou a nossa presença para aqui vir fazer uma promoção de mobiliário português de luxo.
Por cá fala-se o inglês, apesar de por vezes ser difícil de entender. As pessoas são simpáticas e informadas. O nosso maior problema foi a lentidão da internet que nos atrasou muito as nossas tarefas - nas horas de pico nem dava para ver o mail.
Na visita à Marinha fomos recebidos pelo Vice-almirante Comandante da Esquadra que, com 40 anos já tem prevista a ascensão a CEMA - cargo máximo, e sair para as empresas logo a seguir. É a pressão das empresas a recrutar militares para os seus quadros.
Em Singapura há diversão a qualquer hora pelo que houve sempre algo que fazer, fosse a busca dos melhores preços para os mais recentes lançamentos de material electrónico e roupas ou a visita ao descomunal Hotel Marina Sands, de 2500 quartos, com três torres de 200 metros sobre as quais foi construído um navio estilizado de 300 metros, obra de arquitectos portugueses, onde há bares, restaurantes, piscina, miradouro, etc. Em Clarq Quay, antiga zona de docas e armazéns, há agora uma moderna zona de bares e restaurantes com muita animação de rua. As estátuas do Merlion, meio leão, meia sereia, são o símbolo da cidade e atraem vários turistas que fotografam os descomunais e artísticos edifícios com ele no canto. Em Santosa, pequena ilha contígua, ligada por pontes e teleférico há praias e parques de diversões. A Orchade Road pode levar dias a ser percorrida se quisermos ver todas as montras e centros comerciais. A Chinatonw e a Litle Índia também são de visita obrigatória. Com os seus templos. Há ainda bons museus para visitar.
A comida é muito variada e tem muita qualidade, sendo o nosso melhor jantar o que nos foi oferecido pelos Embaixadores Jaime Leitão e Maria Eduarda Grillo, no Indochina que serve gastronomia vietnamita, localizado no Museu das Civilizações Asiáticas, à beira do rio Singapura. Foram as pessoas ideais para nos contar as estórias do living in Singapore. Ele pela sua experiência formal e ela pela sua profissão de arquitecta e decoradora de interiores, de apreciadora de gadjets e de mulher do mundo.
Após mais uma série de despedidas, largámos esta manhã em direcção a Malaca e navegamos de novo no imenso caudal de navios. Felizmente o tráfego é bem controlado e as zonas onde há cruzamentos estão bem definidas. Fundearemos logo de manhã e teremos uma embarcação que levará o nosso pessoal para terra e trará visitas a bordo.
Até lá!